sábado, 5 de junho de 2010

A Gastronomia como mais alta expressão de um povo

Por Maysaa Ibrahim

Palavras-chave: Gastronomia; identidade; turismo

Resumo

Utilizando-se de documentos eletrônicos, pela dificuldade de encontrar bibliografias nessa área, e baseando-se nas idéias de Regina Schütler, o artigo tem um objetivo claro, que é defender a gastronomia e sua função como formadora da identidade de um povo e como propulsora do turismo. Além deste, é preciso manter sempre na lembrança das pessoas o fato em questão para que não se desliguem de suas raízes e para que não percam o que elas tem de mais expressivo e caro dentro do processo devastador da globalização que está cada vez mais presente.

Introdução

No presente artigo apresenta-se a importância da gastronomia no processo de formação de um povo, no desenvolvimento de sua identidade e como a sua mais alta expressão, pois comer é uma arte e a das mais estimulantes e atrativas em nosso mundo, além de ser considerada um ato social.

Turistas apreciadores de gastronomias exóticas existem porque alguns povos com uma cultura bastante presente e enraizada em seus modos de viver, conseguiram mantê-la e passá-la a seus descendentes, o que é um ponto positivo, já que a tarefa da manutenção da identidade não é um processo simples e exige laços fortes entre um povo dentro de uma sociedade tão padronizada e habituada aos famosos fast-foods. Há um enfoque maior da gastronomia porque ela é vista no presente artigo como uma das maiores influenciadoras na identidade cultural de um povo e como diferencial entre eles, além de ser a mais importante ferramenta utilizada como atração turística.

A Gastronomia como mais alta expressão de um povo

Segundo Regina Schütler, “o turismo tem suas bases nas diferentes manifestações patrimoniais, naturais e culturais e os locais históricos encontram-se entre os mais procurados para o turismo internacional” (2003). Seu ponto de vista está correto, sim. O turismo não existiria se todos os povos falassem a mesma língua, trajassem as mesmas roupas, carregassem ideais e pensamentos semelhantes e principalmente se tivessem os mesmos alimentos e as mesmas formas de prepará-lo.

O turismo precisa dessas diferenças porque é delas que sobrevive ao longo do tempo, além de despertarem o interesse de muitos curiosos, amantes da aventura e culturas exóticas, que deixam o conforto de seus lares, para navegar em um mundo pleno de novidades, sabores, mistério e digamos assim, muitas vezes chocante. Digo chocante porque nos deparamos com modos de agir e pensar totalmente inaceitáveis e estranhos dentro de uma sociedade, mas perfeitamente comuns em outras.

Há várias formas de conhecer um novo lugar e uma nova cultura. Mas nada tão interessante e prazeroso como fazer isso por meio das suas produções artísticas e gastronômicas, no qual um turista que anseia pelo novo, poderá entender melhor o processo de formação de um povo, sua história, seus costumes, toda trajetória que levou aquele povo a desenvolver determinada maneira de vida.

Caso não houvessem essas diferenças, não poderíamos despertar interesse dos viajantes e assim, o turismo seria uma palavra sem sentido em nosso vocabulário. Como conseqüência, a economia se estagnaria e a qualidade de vida das pessoas seria precária. Sendo assim, podemos notar nitidamente qual o sentido de preservar o Patrimônio de uma nação, tanto natural quanto cultural.

Schütler afirma que “o legado monumental arquitetônico em si não constitui foco de atenção e que este, isolado, não representa a cultura de um povo como um todo” (2003). Não podemos esquecer que as festas, as danças e principalmente a gastronomia, representam a mais alta expressão e o comportamento dos diversos grupos culturais. Um legado monumental não representa de forma crua a realidade de um povo. Enfatizando um pouco mais sobre a gastronomia, um dos elementos essenciais para entender uma cultura, podemos afirmar que ela se baseia no que a terra e o clima juntos fornecem ao povo de determinado local e que de acordo com isso, este povo vai criando novas maneiras de utilizar o produto da terra, adaptando-o e aperfeiçoando seu consumo, passando seus métodos de geração a geração. E esperto é aquele que mantém sua identidade, mesmo com a globalização e essa mescla de culturas ou imposições de países desenvolvidos.

Entendemos a história de um lugar através de sua gastronomia, que constitui um bem cultural tão valioso quanto um monumento. O que preocupa é o processo da globalização, que está padronizando tudo, tornando tudo tão semelhante e sem graça. Esse crescente interesse do turismo pela gastronomia ajudará a resgatar antigas tradições prestes a desaparecer e a manter a identidade de um povo, o que o torna tão interessante e importante para muitas pessoas que pretendem desvendar o novo.

A alimentação é muito mais do que um ato de subsistência. Se assim fosse, as pessoas não fariam suas refeições em conjunto, cada um se alimentaria isoladamente para saciar a fome daquele momento. A alimentação tem significado simbólico em determinada sociedade, é cultura.
Um ato social que pode passar despercebido, mas está presente fortemente em nossas raízes como componente fundamental e imprescindível do nosso dia a dia.

Comer por comer não existe; as pessoas comem por prazer e com intuito de se identificar com um grupo. E isso não vem só de hoje. Um dos truques masculinos para encantar uma mulher é convidá-la para jantar. Segundo o mestre em Educação, Arte e História da Cultura e professor da faculdade de Gastronomia do Senac de Campos do Jordão/SP, João Luís Almeida Machado, esses hábitos e tradições devem ter surgido a partir do século 18, já que “Os restaurantes, da forma como os conhecemos foram criados na França do século 18”, explica. Assim como o chocolate é conhecido pelo seu poder “afrodisíaco”, (termo utilizado desde o séc. 1 a.C. e deriva de Afrodite, nome da deusa do amor na Mitologia Grega) é também um dos métodos utilizados pelo homem para seduzir uma mulher. Não podemos deixar de citar que o poder da culinária afrodisíaca está relacionada mais com a mente do que com o corpo e sobretudo, à cultura. Afinal como lembra a historiadora Maria L. Leal, em seu livro A História da Gastronomia “cozinhar é uma ação cultural que nos liga ao que fomos, somos e seremos e, também, com o que produzimos, cremos, projetamos e sonhamos”, E complementa: “A fome biológica distingue-se dos apetites, expressões dos variáveis desejos humanos e cuja satisfação não obedece apenas ao curto trajeto que vai do prato à boca, mas se materializa em hábitos, costumes, rituais, etiquetas. Muitos antropólogos já sublinharam o fato de que nenhum aspecto do nosso comportamento, à exceção do sexo, é tão sobrecarregado de idéias”.

Em festas, celebrações, pequenas reuniões, entre outros, o alimento está fortemente presente, como essência de todos os acontecimentos. Parece que ele tem enorme poder psicológico sobre as pessoas, pois as une e promove entre elas ligações antes inexistentes; portanto o alimento transforma o homem de biológico a social e o torna diferente de outros animais, pois lhe fornece o contato com outros povos e cultura. O homem é tão civilizado como se vê hoje graças ao alimento.

Quando lançou o livro Açúcar, em 1937, o pernambucano Gilberto Freyre foi alvo de críticos que não entendiam como um intelectual, um sociólogo, poderia se ocupar com receitas de bolo e outras “futilidades” próprias de mulheres. Sete décadas depois, Freyre é apontado como um dos pioneiros nessa área de estudos que estabelece conexão entre o ato de comer e as relações sociais.

Espera-se que não ocorra a “ homogeneização da cultura “. Que países industrializados não consigam substituir hábitos locais pelos “ fast foods “ da vida, que estão ganhando espaço sim, mas que não adicionam nenhuma vantagem quando se fala em processos nutritivos e que não acrescentam nenhuma espécie de valor cultural.

É preciso fazer valer o conceito de “ Patrimônio Intangível “ introduzido pela Unesco em 1997. Se possível, recuperar e revitalizar todo este vasto legado que está sendo trocado pela uniformidade de uma sociedade cada vez mais capitalista e limitada.

A Gastronomia precisa ser na prática o que é na teoria. “ A arte de saber comer e beber bem. “ Nenhum fast food vai nos dar essa visão do que é comer bem ou beber bem, afinal isso é uma arte. Arte é cultura, é tradição, são raízes fortemente impregnadas em um povo que a mantém e vai passando de geração em geração. É isso que torna um povo forte : união para preservar o que é deles e de mais ninguém. Isso é uma arte e é forte quem a tem, pois não nascemos para sermos homogêneos, padronizados e resignados; ao contrário, somos únicos, cada um com uma identidade, pensamento e ideal.

Voltando às palavras anteriores, sem as diferenças, poderíamos ficar isolados de todo mundo sem sentir interesse pelos outros, pois todas as pessoas seriam iguais, comuns e sem nenhum conhecimento novo. Não haveria comunicação, meios de transporte e principalmente turismo, vocábulo sem nexo para um caso desses.

Podemos concluir, então, que vivemos em uma sociedade quase perfeita. Precisamos do novo e diferente, nunca estranho, para amadurecermos culturalmente e principalmente para preservarmos nossa identidade, que está se perdendo pouco a pouco. Não é tarde, afinal, nossa identidade está nas raízes e quem a recupera, tem nas mãos a força e a arte.

Considerações Finais

O turismo sofrerá graves perdas com a “homogeneização das culturas”, processo que atinge muitos povos desfragmentando seus laços e influenciando de maneira destruidora em sua gastronomia , extinguindo os traços mais fortes e fazendo sucumbir uma identidade cultural própria que levou anos para se formar, desenvolver e se manter ao longo do tempo. Como um povo pode permitir que toda sua identidade construída e enraizada, com uma história toda de formação, possa se perder e ser invadida por uma cultura padronizada e sem graça como esta que está surgindo e a qual a maioria está aderindo?


Um povo é reconhecido como forte quando mantém seus traços culturais, quando os cultiva e os passa de geração a geração, mesmo em meio a essa incrível padronização e essa tendência compulsiva de seguir a moda.

Referências
SCHUTLER, Regina G. . Gastronomia e Turismo. Coleção ABC do Turismo. Editora Aleph. São Paulo, 2003.
Interpoint http://www.interpoint.com.br/ acessado em 15 de novembro de 2004.
Árvore do Bem http://www.arvoredobem.ig.com.br/ acessado em 16 de novembro de 2004.
UNB-Universidade de Brasília http://www.unb.br/ 2004
Revista do Turismo 2003.

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